Cálculo de Penalidades

Lincoln Társio, analista de Regulação da Norven, explica de forma prática como são calculadas penalidades para os concessionários, permissionários ou autorizados de instalações ou serviços de energia elétrica, quando são identificadas não conformidades.

Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL é responsável por regular e fiscalizar os processos de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica.

No âmbito do processo fiscalizatório, a agência monitora continuamente a qualidade da prestação de serviços através de dados e informações disponibilizados pelas próprios agentes regulados com o objetivo de verificar a conformidade dos procedimentos e dos resultados alcançados.

Sendo identificados indícios que apontem deterioração dos serviços prestados ou do equilíbrio econômico financeiro da concessão ou permissão, a ANEEL solicita que os agentes responsáveis apresentem planos de resultados ou instaura diretamente um processo fiscalizatório específico.

Quando solicitados, os planos de resultados deverão conter objetivos, prazos e ações que visem a reversão do quadro observado dentro de um período de acompanhamento, não implicando em novas obrigações, regime excepcional regulatório ou sanções administrativas, mas uma oportunidade para os agentes demostrarem cooperação com a agência, compromisso com suas obrigações regulatórias, bem como com a prestação de um serviço de qualidade. Não sendo observada a correção dos problemas identificados, a Agência poderá decidir pela realização de fiscalização específica, a qual poderá evoluir para um processo punitivo.

As fiscalizações específicas são realizadas pelas superintendências de fiscalização da ANEEL (SFE, SFF e SFG) ou agências estaduais conveniadas, de forma a avaliar o cumprimento da conformidade regulatória através de evidências documentais e informações dos sistemas informatizados. Sendo comprovadas eventuais não conformidades, seja por justificativas insatisfatórias ou por não atender requisitos normativos, fica então o agente infrator sujeito às penalidades definidas na Resolução Normativa nº 846, de 11 de junho de 2019, vigente desde dezembro do mesmo ano da sua publicação. A penalidade pode ser uma simples advertência, para os casos em que não houver reincidência específica e a infração for de baixa ofensividade, mas também podem ser aplicadas multas e até mesmo abertura de processos de intervenção ou caducidade da concessão.

Ao final de um processo fiscalizatório, é emitido um Relatório de Fiscalização – RF resumindo as não-conformidades identificadas e em alguns casos são apresentadas recomendações ou determinações para o agente fiscalizado. O documento é acompanhado de um Termo de Notificação – TN que define um prazo para apresentação de uma manifestação. Após a análise desta ou o encerramento do prazo, a agência responsável pela fiscalização poderá emitir um Auto de Infração – AI, documento que encerra a etapa de fiscalização, contendo todas as não-conformidades identificadas associadas aos valores de multa, iniciando a etapa do processo administrativo punitivo.

Nesse contexto, compete ao Superintendente responsável pela ação fiscalizadora a definição das condicionantes que compõem o cálculo da multa, como abrangência, gravidade, danos e vantagem. Definidos esses parâmetros, que consistem na fixação do valor base ou na primeira etapa do cálculo, é realizada a segunda etapa, que compreende a aplicação de percentuais relacionados à avaliação das circunstâncias agravantes e/ou atenuantes.

1º Etapa do cálculo da penalidade: Fixação da Pena base

Na 1º Etapa é definido o valor base da multa, obtido a partir da base de cálculo para aplicação de multa aos concessionários, permissionários ou autorizados de instalações ou serviços de energia elétrica.

base de cálculo corresponde ao valor da Receita Operacional Líquida – ROL, oriunda da arrecadação dos serviços vinculados à concessão, permissão ou autorização da distribuição e transmissão de energia elétrica, correspondentes aos doze meses anteriores à lavratura do AI.

No caso de agente de transmissão que não esteja em operação, a base de cálculo será a Receita Anual Permitida – RAP vigente na data da lavratura do AI.

Nos casos de autoprodução e produção independente, a base de cálculo é o valor estimado da energia produzida, obtido a partir da soma do produto da parcela da garantia física comprometida no Ambiente de Contratação Regulada – ACR pelo preço atualizado da energia comercializada e do produto da parcela da garantia física destinada ao Ambiente de Contratação Livre – ACL e/ou à autoprodução pelo Valor Anual de Referência – VR vigente quando da lavratura do AI, ambos correspondentes aos doze meses anteriores à lavratura do AI.

E por último, tratando-se das entidades responsáveis pela operação do sistema ou pela comercialização de energia elétrica, a base de cálculo das multas será o orçamento anual mais recente da entidade.

Definida a base, o cálculo do valor base da multa é então parametrizado conforme descrito pela equação a seguir:

Valor Base da Multa=(Base de Cálculo)×(% Máximo do Grupo)×(P1×A + P2×G + P3xD + P4×V)

Onde:

  • A – Abrangência (%);
  • G – Gravidade (%);
  • D – Danos resultante para o serviço e para os usuários (%); e
  • V – Vantagem auferida (%).

Abrangência representa o percentual de não conformidade identificada em uma amostra ou processo,enquanto a Gravidade contempla a análise do potencial lesivo da conduta praticada. Já na avaliação dos Danos devem ser considerados os impactos para o consumidor final e em Vantagem auferida o quanto o Agente infrator se beneficiou com a não-conformidade. Estas condicionantes podem variar de 0% a 100%, assumindo caráter discricionário, sendo definidas pelo Superintendente responsável pela ação fiscalizadora.

A expressão também estabelece uma relação de pesos para cada uma das condicionantes. Em dezembro de 2019, por meio do Ofício Circular nº 25/2019-SFE-SFF-SFG/ANEEL, foi estabelecida a uniformização dos pesos que seriam praticados para cada uma das condicionantes, cujo somatório totaliza 100:

Já o % Máximo do grupo corresponde aos limites percentuais incidentes sobre a Base de Cálculo, podendo variar de 0,125% a 2% considerando a tipificação da infração, as quais constam divididas em 5 grupos, descritos nos Arts. 8º, 9º, 10, 11, 12 e 13 da REN 846/2019, conforme apresentado a seguir:

Os percentuais levam em consideração o impacto das infrações. Quando o fato constitutivo da infração for de mera conduta e não implicar prejuízo direto à exploração do serviço ou instalação de energia elétrica, esta poderá ser enquadrada no grupo I, já quando resulta em prejuízo direto e significativo aos serviços ou consumidores e/ou usuários poderá ser enquadrada no grupo V.

2º Etapa do cálculo da penalidade: Avaliação das Circunstâncias Agravantes e Atenuantes

Na 2º Etapa do cálculo serão avaliados possíveis condicionantes que possam agravar a penalidade ou atenuar os valores calculados.

  • Agravantes

Em caso de reincidência, o valor base da multa será acrescido em 40% para cada caso de reincidência específica, até o valor máximo de 120%, considerando os processos julgados no período de até 2 anos anteriores à lavratura do Auto de Infração – AI.

Caso a Autuada tenha deixado de atender, no prazo, as determinações constantes em processos punitivos, o valor base da multa será acrescido de 15% para cada caso de descumprimento.

Caso existam antecedentes,ou seja, registro de qualquer penalidade julgada pela Agência, nos últimos 4 anos anteriores à lavratura do Auto de Infração – AI, o valor base da multa será acrescido de 1% a 5% para cada processo irrecorrível, até o limite de 50%, de acordo com o somatório dos percentuais das multas aplicadas em relação ao valor base, conforme descrito abaixo:

Os percentuais das multas aplicadas podem ser obtidos no voto do relator ou no Auto de Infração – AI dos processos anteriores, os quais correspondem a dosimetria final da penalidade.

A verificação dos processos anteriores pode ser realizada através do portal da ANEEL, via consulta processual e também nas ferramentas de consultas de fiscalizações realizadas pelas superintendências de fiscalização SFESFF e SFG.

  • Atenuantes

Em caso de cessação espontânea da infração e reparação total do dano ao serviço e aos consumidores ou usuários, previamente à comunicação formal do agente regulador quanto à realização de ação de fiscalização ou da lavratura de Termo de Notificação – TN, serão deduzidos 95% (noventa e cinco por cento) do valor da multa.

E no caso de cessação da infração e reparação total do dano ao serviço e aos consumidores ou usuários, até o fim do prazo estabelecido para manifestação ao Termo de Notificação – TN, serão deduzidos 50% (cinquenta por cento).

Em ambos, a cessação da infração e a reparação dos danos causados ao serviço e aos consumidores ou usuários devem ser comprovadas à Fiscalização previamente à lavratura do Auto de Infração – AI.

Pagamento da Multa

O pagamento da multa deverá ser efetuado no prazo de 20 dias, contados a partir da lavratura do Auto de Infração – AI ou do proferimento e comunicado da decisão acerca da aplicação das penalidades, cabendo direito a interposição de recurso no prazo de 10 dias contados a partir da mesma data.

Nesse contexto, é importante destacar que existe a possibilidade de o agente infrator renunciar expressamente ao direito de interposição de recurso, o que concederá a redução de 25% (vinte e cinco por cento) no valor da multa aplicada.

Conclusão

Os processos fiscalizatórios se configuram como uma das atividades mais importantes das Agências reguladoras nos seus setores regulados, não simplesmente como uma ferramenta punitiva, mas como um relevante instrumento de identificação dos procedimentos em desconformidade com o regulamento e, através dos seus efeitos, de incentivo à correção para benefício dos consumidores e da própria concessão.

A REN 846/2019 alterou a forma como a agência realiza o processo fiscalizatório, regulamentando os Planos de Resultados, incluindo a possiblidade de uma conduta e correção espontânea e estabelecendo outros incentivos à adequação dos serviços prestados, como a possibilidade de redução de até 95% das multas aplicadas. Por outro lado, a não adequação pode dobrar o valor das multas ou até evoluir as penalidades para um processo de caducidade da concessão.

Portanto, o novo regulamento reforça o direcionamento regulatório da ANEEL de beneficiar os agentes que se dedicam à melhoria dos seus procedimentos e colaboração com os processos fiscalizatórios, por outro lado, estabelecendo maior austeridade com aqueles com postura oposta.

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